sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Um "Evangelho segundo Pápias"?

PÁPIAS DE HIERÁPOLIS E A TRADIÇÃO DOS EVANGELHOS

José Aristides da Silva Gamito

Na obra “História Eclesiástica”, Eusébio de Cesareia nos informa que Pápias de Hierápolis preservou ensinamentos de Jesus no escrito “Explicações sobre as Palavras do Senhor”.  Nas citações que Eusébio faz de sua obra percebemos a preocupação que houve na antiguidade em preservar os verdadeiros ensinamentos de Jesus. Pápias procurava ouvir pessoas que conviveram com os apóstolos para garantir essa autenticidade da doutrina.
Porém, ao discutir essas memórias tão procuradas por Pápias, Eusébio já enfrentava dificuldades em discernir lendas de fatos históricos. A literatura e o fechamento de um cânone foram importantes para padronizar a doutrina. Uma função que tiveram também os concílios, mas ao mesmo tempo com o processo de institucionalização da igreja, muitas tradições sobre Jesus caíram no esquecimento. É um processo de perdas e ganhos. As igrejas buscaram na institucionalização algum consenso para a sobrevivência do movimento cristão, mas com a rejeição e destruição de obras heréticas ou não-canônicas houve um silenciamento de outras vozes do cristianismo primitivo.
Na obra de Pápias há um esforço de preservação de memórias de Jesus. Eusébio nos diz que ele ouvi dois discípulos dos apóstolos: Aristião e João, o Presbítero. Alguns fatos são citados pelo autor de “História Eclesiástica”. Conforme esses relatos, o apóstolo Filipe e suas filhas viveram em Hierápolis e cita dois milagres, um de ressurreição de um morto e outro de um homem que bebeu veneno e nada sofreu.
As tradições de Pápias envolvem “algumas estranhas parábolas do Salvador e de sua doutrina, e algumas outras coisas ainda mais fabulosas.” Uma das citações procura explica a autoria do Evangelho de Marcos:

“E o presbítero dizia isto: Marcos, que foi intérprete de Pedro, pôs por escrito, ainda que não com ordem, o quanto recordava do que o Senhor havia dito e feito. Porque ele não tinha ouvido o Senhor nem o havia seguido, mas, como disse, a Pedro mais tarde, o qual transmitia seus ensinamentos segundo as necessidades e não como quem faz uma composição das palavras do Senhor, mas de tal forma que Marcos em nada se enganou ao escrever algumas coisas tal como as recordava. E pôs toda sua preocupação em uma só coisa: não descuidar nada de quanto havia ouvido nem enganar-se nisto o mínimo.”[1]

            A autenticidade da obra de Marcos é garantida por ele ter ouvido Pedro e através das recordações do apóstolo, o evangelista não se enganou e nem descuidou de nada que Jesus fez e ensinou.
            Os escritos de Pápias são importantes para história da transmissão das memórias de Jesus e os evangelhos. Bauckham sugere que Pápias escreveu um texto similar aos evangelhos, alguma coleção de ditos de Jesus, a partir de outros evangelhos ou a partir de fontes orais. Ou poderia ser somente um comentário sobre as tradições sobre Jesus.[2] Se existiu um “Evangelho segundo Pápias”, ele ficou perdido.

Referências
BAUCKHAM, Richard. Papias and the Gospels. Disponível em: http://austingrad.edu/images/SBL/Papias%20and%20the%20gospels.pdf . Acesso em 08 dez. 2017.
CESAREIA, Eusébio de. História Eclesiástica. São Paulo: Novo Século, 2002, p. 74-75.



[1] CESAREIA, Eusébio de. História Eclesiástica. São Paulo: Novo Século, 2002, p. 74-75.

[2] BAUCKHAM, BAUCKHAM, Richard. Papias and the Gospels. Disponível em: http://austingrad.edu/images/SBL/Papias%20and%20the%20gospels.pdf . Acesso em 08 dez. 2017, p.2.

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