A reconstituição do
passado sempre será uma tarefa imprecisa. O conhecimento que temos de
personalidades históricas está condicionado ao testemunho daqueles que
transmitiram a informação. E, além disso, todo testemunho é ideologicamente
marcado. Há algumas personalidades com maior peso histórico que acabam sendo vítimas
de disputas. Quando procuramos saber quem foi Jesus, ainda encontramos algumas
pessoas que duvidam da sua existência.
O problema que temos do
conhecimento histórico de Jesus não é muito diferente de outras pessoas da
antiguidade. Há quem pergunta também se Sócrates existiu ou não. Para o caso do
conhecimento de Jesus temos fontes internas ao cristianismo e fontes externas
de historiadores antigos. Os evangelhos são as fontes principais de informação
sobre Jesus. No cristianismo antigo, foram escritos dezenas de evangelhos. Além
dos quatro evangelhos canônicos, temos o Evangelho de Tomé (transmite os
ensinamentos de Jesus), o Evangelho da Infância de Tomé (narra fatos da
infância de Jesus, o Evangelho de Pedro (narra sua condenação e morte). Estes são
apenas alguns exemplos de evangelhos apócrifos.
O uso destas obras como
pesquisa histórica tem seus desafios. Não se pode tratar os evangelhos,
genericamente, como fontes históricas. Mas eles contêm, indubitavelmente,
elementos históricos importantes para se reconstituir a identidade de Jesus. É
necessário ter claros critérios de pesquisa. Alguns textos mitificaram tanto a
figura de Jesus que não são confiáveis para fins históricos.
As principais fontes
sobre Jesus foram escritas por autores cristãos. Porém, há pessoas fora do
círculo cristão que escreveram também sobre sua existência como Flávio Josefo. Josefo
foi um historiador judeu nascido no ano 37. Ele redigiu quatro obras: “Guerra
Judaica” (GJ), “Antiguidades Judaicas” (AJ), “Contra Ápio” e “Vida”, a sua
autobiografia. Em seus escritos, ele menciona três pessoas relacionadas com o
Novo Testamento: João Baptista (AJ 18, 116-119), Jesus Cristo (AJ 18, 63-64) e Tiago,
irmão de Jesus (AJ 20, 200).
Nas “Antiguidades
Judaicas”, quando Josefo escreve sobre Herodes, informa que João Batista foi
executado injustamente e que Herodes foi punido pela derrota em uma guerra
contra o rei Aretas. A respeito de
Jesus, ele escreve quando trata do governo de Pilatos. Jesus é descrito como um
sábio que foi executado por Pilatos, cujos seguidores formaram a tribo dos
cristãos. O texto informa que Jesus era: a) sábio; b) bom; c) foi crucificado;
d) fez discípulos; e) foi considerado Messias e ressuscitou.[1]
Depois informa ainda sobre um irmão de Jesus: Tiago. Segundo seu relato, Tiago
foi apedrejado sob o governador Albino. O motivo da condenação foi por ter
violado a Lei.[2]
Portanto, as obras de Josefo são muito importantes para os estudos do Novo
Testamento.
Nesta direção, aparece
o historiador Suetônio. Ele comenta na obra “Vida de Cláudio” sobre os cristãos
e menciona Cristo (Chrestus). Ele diz
que os judeus foram expulsos de Roma por causa tumultos instigados por Cristo. Além
desses dois historiadores, há dezenas de outros testemunhos. Muitos deles não
dão detalhes. Além dos testemunhos internos e externos, existem aqueles
imediatos: a) São as atas do governo de Pôncio Pilatos – eram documentos
oficiais que narravam a condenação de Jesus (os textos não sobreviveram, mas
são citados por Justino Mártir e Tertuliano); b) A versão das autoridades judaicas
(a Mishná conta sobre a execução de
Jesus).
Portanto, temos os
testemunhos diretos e indiretos, intra-cristãos e extra-cristãos. Todos falam
de Jesus, sejam a favor ou contra. Não há dúvidas sobre a existência de Jesus,
mas responder sobre quem era Jesus com precisão não é simples. Teremos várias
respostas. Embora, seja possível consenso sobre alguns fatos. O Cristo da fé
sobressai na maioria dos textos porque são obras de propagandas do próprio
movimento cristão.
No campo das Ciências das Religiões, é
importante considerar todos estes textos para entender como se estruturaram e
se desenvolveram as crenças do cristianismo antigo. A diversidade de fonte
permite uma visão de como o fenômeno era visto dentro e fora dos círculos
cristãos. Os estudos do Novo Testamento também não estão sendo mais realizados
como se seus textos fossem uma ilha.
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