quinta-feira, 27 de abril de 2017

V - Religião e Filosofia



TACIANO CONTRA OS FILÓSOFOS

Nos primórdios do cristianismo, muitos intelectuais pagãos convertidos passaram a escrever obras que justificavam racionalmente os princípios da fé cristã.  Dentre essas obras está o “Discurso contra os Gregos” de Taciano, o Assírio.
Nesta obra, Taciano (120-180 d. C.), argumenta que o cristianismo é superior ao paganismo e à filosofia grega. Ironicamente, ele reserva um defeito para cada filósofo grego e critica seu pensamento. Abaixo, um excerto para conhecimento:

Não posso aprovar Heráclito, quando diz:“Eu ensinava a mim mesmo”, por ser autodidata e também soberbo. Nem o louvaria por ter escondido o seu poema no templo de Ártemis, para que depois a sua edição ficasse envolta em mistério. Os que se interessam por essas questões dizem que o poeta trágico Eurípedes foi lá, leu o livro e propagou de memória e com todo empenho as trevas de Heráclito. Mas o que pôs em evidência a sua ignorância foi o modo como morreu: atacado de hidropisia, e tratando a medicina como a filosofia, envolveu-se com estrume de boi e, quando este endureceu, produziu convulsões em todo o seu corpo e ele morreu de espasmo. Também se deve rejeitar Zenão, quando ele afirma que por meio da conflagração universal os mesmos homens ressuscitarão para as mesmas ações: Amito e Meleto para acusar Sócrates; Busíris para matar seus hóspedes e Herácles para repetir seus trabalhos. Na hipótese da conflagração, Zenão admite mais maus do que bons, pois houve apenas um Sócrates e um Herácles e outros do mesmo tipo, que sempre foram poucos e não muitos. Segundo ele, sempre haverá mais maus do que bons, e o próprio Deus aparecerá como autor do mal ao ter que morar em cloacas, entre vermes e malfeitores.
Quanto à charlatanice de Empédocles, as erupções da Sicília demonstraram que, não sendo deus, ele mentia dizendo que o era. Também me rio dos contos de velha de Ferecides e de Pitágoras, que herda a sua doutrina, e de como Platão, embora alguns não o queiram, imita um e outro. De fato, quem aprovaria o casamento de cão de um Crates e não, de preferência, rejeitando a grande charlatanice de seus seguidores, voltará a procurar o que é verdadeiramente bom? Não vos deixeis, portanto, arrastar por esses bandos de pessoas que gostam mais do barulho do que do saber e que dogmatizam coisas contraditórias, cada um dizendo o que lhe vem à boca. São muitos os choques que acontecem entre eles, pois um odeia o outro, criando doutrinas opostas por pura fanfarronice, desejando postos eminentes. Seria melhor que, não se antecipando à realeza, não adulassem os que mandam, mas esperasse que os grandes se aproximassem deles.

TACIANO, o Sírio. Discurso Contra os Gregos. In: Padres Apologistas. São Paulo: Paulus, 1995, p. 34.



            A tendência em menosprezar a filosofia em favor da religião cristã foi uma atitude típica de uma fase da história do cristianismo. Depois os autores cristãos passaram a usar categorias filosóficas para sistematizar os dogmas do cristianismo. Desta aproximação entre mensagem cristã e linguagem e método filosóficos nasceu a teologia.

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