TACIANO CONTRA OS FILÓSOFOS
Nos
primórdios do cristianismo, muitos intelectuais pagãos convertidos passaram a
escrever obras que justificavam racionalmente os princípios da fé cristã. Dentre essas obras está o “Discurso contra os
Gregos” de Taciano, o Assírio.
Nesta
obra, Taciano (120-180 d. C.), argumenta que o cristianismo é superior ao
paganismo e à filosofia grega. Ironicamente, ele reserva um defeito para cada
filósofo grego e critica seu pensamento. Abaixo, um excerto para conhecimento:
Não posso aprovar Heráclito, quando diz:“Eu ensinava a
mim mesmo”, por ser autodidata e também soberbo. Nem o louvaria por ter
escondido o seu poema no templo de Ártemis, para que depois a sua edição
ficasse envolta em mistério. Os que se interessam por essas questões dizem que o
poeta trágico Eurípedes foi lá, leu o livro e propagou de memória e com todo
empenho as trevas de Heráclito. Mas o que pôs em evidência a sua ignorância foi
o modo como morreu: atacado de hidropisia, e tratando a medicina como a filosofia,
envolveu-se com estrume de boi e, quando este endureceu, produziu convulsões em
todo o seu corpo e ele morreu de espasmo. Também se deve rejeitar Zenão, quando ele afirma que por meio
da conflagração universal os mesmos homens ressuscitarão para as mesmas ações:
Amito e Meleto para acusar Sócrates;
Busíris para matar seus hóspedes e Herácles para repetir seus trabalhos. Na hipótese
da conflagração, Zenão admite mais maus do que bons, pois houve apenas um Sócrates
e um Herácles e outros do mesmo tipo, que sempre foram poucos e não muitos.
Segundo ele, sempre haverá mais maus do que bons, e o próprio Deus aparecerá
como autor do mal ao ter que morar em cloacas, entre vermes e malfeitores.
Quanto à charlatanice de Empédocles, as erupções da Sicília demonstraram
que, não sendo deus, ele mentia dizendo que o era. Também me rio dos contos de
velha de Ferecides e de Pitágoras,
que herda a sua doutrina, e de como Platão,
embora alguns não o queiram, imita um e outro. De fato, quem aprovaria o
casamento de cão de um Crates e não, de preferência, rejeitando a grande
charlatanice de seus seguidores, voltará a procurar o que é verdadeiramente
bom? Não vos deixeis, portanto, arrastar por esses bandos de pessoas que gostam
mais do barulho do que do saber e que dogmatizam coisas contraditórias, cada um
dizendo o que lhe vem à boca. São muitos os choques que acontecem entre eles,
pois um odeia o outro, criando doutrinas opostas por pura fanfarronice,
desejando postos eminentes. Seria melhor que, não se antecipando à realeza, não
adulassem os que mandam, mas esperasse que os grandes se aproximassem deles.
TACIANO, o Sírio. Discurso Contra os Gregos. In: Padres
Apologistas. São Paulo: Paulus, 1995, p. 34.
A tendência em menosprezar a filosofia em
favor da religião cristã foi uma atitude típica de uma fase da história do
cristianismo. Depois os autores cristãos passaram a usar categorias filosóficas
para sistematizar os dogmas do cristianismo. Desta aproximação entre mensagem
cristã e linguagem e método filosóficos nasceu a teologia.